dimanche, septembre 14, 2008

Enganando momentos

Pensava que todos entenderiam suas piadas, não é que fosse estúpida ou inconveniente. Por que diabos os outros já saíam jogando pedras, se quem falhou em não compreender foram eles? Passou a pedir demasiados perdões, após certo tempo. Na dúvida, se desculpava: "é que já protagonizei maus bocados por culpa de minhas piadas ditas infames, então...", e fazia aquela cara de fazer-o-quê.
Já sentia certa amargura no espírito, pois não era mais a mesma - e a mesma, aliás, agradava-lhe bem mais. Envelhecia mais de esperança do que de pele. Porém, as idéias estavam lá, firmes. Mais formadas, talvez, do que seu corpo, que já não era mais o mesmo, também. Nada mais era a mesma coisa, e isso lhe causava certo misto de prazer em fugir da rotina com saudades de sentir-se menos confusa e mais ignorante - aquela ignorância boa, de quando viver parecia mais simples. Vontade de fugir ao passado ou ao futuro? A verdade é que o presente jamais a satisfaria por completo... quem sabe no futuro?
Outrora, buscava a felicidade em acontecimentos grandiosos que mudassem para sempre a sua vida, mas frustrou-se. Vem se frustrando, aliás, porque as ilusões - por serem passageiras - nada mais fazem do que isso: passar. E ficam passando, sem parar, cumprindo com uma obrigação melancólica, sequer desconfiando de que deveriam ir passear, em vez de ficarem ali, esclarecendo vida alheia. E quanto mais buscou (a felicidade), mais afastou (a felicidade). Não procurou tristezas... Por que raios elas apareceram?
Experimentou, então, desistir da longínqua felicidade plena e viver cada momento como se fosse o último. Mas o problema já veio na raiz: só era feliz durante esses momentos. E depois? Mais momentos. Certo, mas... e nos intervalos? Pausa para o lanche? Não sentia mais o gosto de nada, e já sentia-se bem alimentada de eternos meros momentos. O show tem que continuar, pensava - não há tempo para gulodices.
Mas nesse momento, enquanto criava estômago para seguir em frente, deu-se conta de que intervalos são muito comerciais. Não quis mais parar seu espetáculo toda hora e à toa, já que concluiu - sozinha - que não tinha nada de interessante pra fazer nesse meio tempo. E os intervalos só não foram mais comerciais porque não foram convincentes: descobriu que, emendando um momento no outro (se os costurasse bem nos intervalos), faria-os deixarem de ser momentos. Claro que não digeriu a idéia de primeira, mas foi pensando nisso, enquanto descia do palco imaginário que (não) criou e enquanto tirava a maquiagem que não cobria tanto os seus olhos que não pudesse enxergar o caminho de volta. De repente, fez uma piada para si mesma, e não a entendeu. Mas não pediu desculpas, apenas riu. Depois reparou, por acaso, que se sentia bem naquele momento. Era um momento de felicidade.