Estava passando pela sala e me aproximei da janela. Havia chovido o dia inteiro e restavam várias gotinhas pelas hastes de todo o varal. Em meio à escuridão total, em que talvez o foco de luz mais próximo fosse o da janela de um vizinho, era possível apenas ver as gotinhas, iluminadas feito luzinhas de Natal. Já hesitante devido à (falta de) qualidade da minha câmera, decidi, na hora, que deveria ao menos tentar tirar uma foto. Flash estava descartado. Sem ele, porém, não se veria absolutamente nada. Ainda assim, fiz preces para que milagrinhos como modo noturno, ISO e laterninha do celular por trás pudessem resolver alguma coisa, na minha total ignorância para fotografia.
Em meio a cuidados com janela aberta e gatos brincantes no escuro, fiz tentativas praticamente inúteis. A representação daquela linda e efêmera imagem, pelo visto, insistia em não ser eternizada senão na minha memória. Não queria, de certo, virar objeto de contemplação em massa, que é o que acontece com toda e qualquer imagem, hoje em dia. Queria apenas existir, ali, naquele momento noturno e solitário. Mais ninguém saberia que ela existiu, além de mim. Não passaria de um fato cotidiano e quase tolo, que nada tem a ver com arte. Não passaria... mas passou.
Falham as tecnologias, faltam os conhecimentos técnicos... No entanto, o poder que a palavra tem para descrevermos a cena que quisermos, da forma que quisermos, com ou sem luz, jamais falhará. Eu lancei as palavras. A cena, agora, fica por conta de quem ler.
1 commentaire:
Só agora fui ver tuas últimas atualizações do blog.
Gostei muito da tua descrição e me chamou atenção justamente a parte "Queria apenas existir, ali, naquele momento noturno e solitário". Porque me lembrei da minha leitura preferida sobre fotografia que é o "A câmara clara", do Roland Barthes, onde logo no início ele escreve sobre o espanto dele com uma fotografia determinada, que não teria sido compartilhado por ninguém, e aí considera que: "a vida é, assim, feita a golpes de pequenas solidões". E essa tua "imagem de pequena solidão" das gotas no varal me pareceu realmente encantadora.
Icaro
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